quinta-feira, 9 de abril de 2009

Martin Scorsese presents The Blues

Acabo de rever toda a série de filmes que Martin Scorsese produziu em 2003 intitulada como "The Blues". Esta série conta com sete filmes, cada um deles dirigido por um diretor diferente - Wim Wenders, Richard Pearce, Charles Burnett, Marc Levin, Mike Figgis, Clint Eastwood e o próprio Scorsese - aonde os diretores conseguem, através de raríssimas imagens de arquivo e de histórias, lendas e muita inspiração, contar o que o blues representa, das mais distintas maneiras.

Desde a tensão entre o sagrado e o profano explorada por Wenders e Burnett, passando pela homenagem à Memphis de Pearce, pela excelente idéia de Levin de juntar Chuck D com veteranos do blues e explorar suas raízes, como a de Figgis que analisa os efeitos da "invasão britânica" na música americana, a história do piano no blues contada por Eastwood e finalmente o título de Scorsese que analisa as raízes africanas dessa música. Enfim, um documento imperdível para o amante do blues, que vale a pena comprar o box para revê-lo de tempos em tempos.

Me lembro do lançamento dessa série no Brasil, na Mostra de Cinema de São Paulo, aonde, num ensolarado sábado, no CineSesc da Augusta, deram todos os sete filmes na sequência. Eu, acompanhado por meu grande amigo Luiz Inácio - o Lula - aceitamos o desafio de ver a todas. Para os que não conhecem, o CineSesc tem, ao fundo da sala de projeção, um bar, cuja separaçao com a sala é uma grande parede de vidro. Assim sendo, podíamos ficar lá bebendo e fumando, o que nos ajudaria a atravessar melhor a maratona. Bom, depois do quarto filme - aproximadamente oito horas depois, entramos às 10:00hs e saímos por volta das 19:00hs - já estávamos bêbados e decidimos sair. Mas valeu cada minuto que estivemos ali.

Deixo aqui as palavras do próprio Scorsese e espero que vocês não deixem de ver.

"Nunca vou me esquecer da primeira vez que escutei Leadbelly cantando 'C.C.Rider'. Me hipnotizou. Como a maioria das pessoas da minha geração, crescí escutando rock'n roll. De repente, por um momento, pude ouvir de onde tinha surgido tudo e sentir que o espírito por trás da música, por trás dessa voz e dessa guitarra, vinha de algum lugar distante no tempo.
Muitos conhecidos sentiram o mesmo impacto ao descobri-lo. O rock'n roll parecia para nós que tinha simplesmente nascido no rádio ou nas lojas de disco. Se converteu em nossa música e numa maneira muito importante de defirnir a nós mesmos e de fazer-nos sentir diferentes de nossos pais. Mas foi entãao que descobrimos outro nível mais profundo, a história que está por trás do rock e do R&B, a música por trás da nossa música. Todos os caminhos conduzem à fonte original, e essa fonte é o blues.
Todos gostamos de imaginar que a arte pode surgir do nada e que nos comoverá mais do que qualquer outra coisa jamais vista ou lida. A grande verdade é que tudo - cada quadro, cada filme, cada peça de teatro, cada música - provêm de algo que o precede. É uma cadeia de respostas humanas. A beleza e o poder da arte estão no fato de que ela não pode ser estandarizada ou mecanizada.
Deve ser um intercambio humano, que se transmite de umas mãos a outras: tudo o demais não é arte. É eternamente antiga e nova ao mesmo tempo, já que sempre existirão jovens artistas que ouvem e vêem obras que lhes precederam, inspirando-se e criando algo próprio a partir do que foram assimilando.
Quando se ouve a Skip James cantando 'Devil got my Woman' ou a Son House cantando 'Death Setter Blues' ou a John Lee Hooker tocando sua guitarra, quando se escuta de verdade - e acreditem, não é difícil, porque essa música capta toda a atençao desde a primeira nota - se ouve algo muito valioso que se está transmitindo. Um segredo muito valioso.
E está aí, em todos esses ecos e influências, em todas as frases e giros de guitarras comuns, em todas essas músicas que foram passando de cantor a cantor, às vezes modificando-se pelo caminho e convertendo-se assim em músicas totalmente novas.
Se você já conhece o blues, talvez esses filmes te dêm uma razão para voltar a ele. E se você nunca ouviu o blues e se encontra com ele pela primeira vez, te prometo uma coisa: sua vida está a ponto de mudar, para melhor."


Martin Scorsese


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