sexta-feira, 21 de outubro de 2011

Notas do Brasil desde longe

A mancha que crece no Brasil
Os escândalos de corrupção provocaram a queda de quatro ministros desde Junho e o de Esportes está na corda bamba.
Fernando García – correspondente de LA VANGUARDIA

A sujeira estava lá, como está e sempre esteve em todos os países. Porém foi a apenas alguns meses, logo após Dilma Rousseff chegar à presidência, que a mancha de corrupção apareceu descarada e começou a estender-se rapidamente sobre o Brasil; até o ponto de ofuscar o brilho de seu êxito económico e levantar receios sobre a organização da Copa do Mundo de 2014. Em quatro meses caíram quatro ministros. E o de Esportes está na fila.

Essa vertiginosa proliferação de escândalos não se pode entender sem levar em conta as particularidades da política brasileira. Para começar, o Executivo se sustenta sobre uma “base aliada” composta por uma dezena de partidos das mais variadas vertentes: a metade dos 22 representados da Câmara, aonde se sentam 513 deputados.

A coalizão do Governo está liderada por duas forças tão díspares como o esquerdista Partido dos Trabalhadores (PT) e o Partido do Movimento Democrático Brasileiro (PMDB), de centro-direita. O partido da presidenta (PT) tem 86 deputados na Câmara Federal: um mero 17% do total. Daí a necessidade da própria coalizão e de contínuos pactos de geometria variável.

Porém, como tantas e tão variadas formações chegam a coligar-se e a entender-se para legislar e governar? Somente através da distribuição de cargos e favores e transações de projectos e propostas. Tudo isso com as correspondentes atribuições  orçamentárias como elemento chave das negociações. Não há analista político que ponha em dúvida a vigência dessa engrenagem. E são muitos os que pedem uma reforma urgente do sistema, devido ao perigo que engloba.

Para o cientista político Leonardo Avritzer, da Universidade de Minas Gerais, a corrupção no Brasil tem uma relação direta com o sistema eleitoral, com a fragmentada estrutura de partidos e com a insuficiência de recursos legalmente cedidos a financiar as formações. “As coalizões formadas para governar – afirma – converteram-se num sistema de troca no qual a nomeação dos membros do governo é utilizada como meio de arrecadação para as campanhas.”

Mas a história recente demonstra que o dinheiro desviado dos cofres públicos nem sempre fica nos partidos; às vezes chega aos bolsos de alguns dirigentes.

Desde que o primeiro escândalo pôs em evidência a seu ministro da Presidência e homem de confiança, Antonio Palocci, Rousseff exibiu uma insólita firmeza, de tolerância zero, ao enfrentar a corrupção. A presidenta obrigou a todos os implicados a renunciar: não só Palocci e os três ministros que o seguiram ao após a descoberta de outras redes de desvio de verbas, mas também dezenas de altos cargos e funcionários implicados. É a operação faxina, ainda em andamento.

Em determinados momentos os castigos fizeram tremer as bases da coalizão governamental. O risco era e é óbvio para a chefe de governo. Mas Rousseff conquistou o apoio da população, que a cada momento sai às ruas para pedir-lhe que não freie seu desejo depurador. Não é de se estranhar, dada a gravidade dos danos causados. Alguns dias atrás a influente Federação da Indústrias de São Paulo publicou um estudo segundo o qual no ano passado os desvios de fundos públicos custaram ao Brasil entre 21 e 35 bilhões de euros: de 1,4% a 2,3% do PIB.

Todos os escândalos descobertos até agora no seio do Governo Rousseff explodiram a partir de informações da imprensa brasileira, mais ativa que nunca a respeito. A quantidade de material a as acusações cruzadas durante as correspondentes brigas internas revelam um denso tráfico de dossiers entre facções que se atacam e buscam vingança.

A presidenta é consciente dos riscos que corre. Ao seu ministro de Esportes, Orlando Silva, concedeu o benefício da duvida enquanto a Promotoria investiga sua participação no suposto financiamento ilegal do Partido Comunista através de uma ONG. Ao fim dessa edição, Silva tentava explicar-se na Câmara de Deputados.

Nenhum comentário:

Postar um comentário