sexta-feira, 22 de julho de 2011

B.B. King – Live at The Regal (1964)


Sem duvida esse é um dos melhores discos de blues ao vivo já gravados, talvez no melhor momento da carreira de B.B. King e no Regal, a resposta de Chicago ao Apolo no Harlem. A performance de B.B. King é visceral, cantando tão forte que arranha as cordas até nas notas mais agudas, acompanhado vigorosamente por sua afiada Lucille. Entre os hits, “How Blue Can You Get”, “Worry, Worry” ou “You Upset Me Baby” levam seu público mais fiel – o próprio King diz já ter tocado nesse palco centenas de vezes – ao delírio, uma recepção heróica e às vezes até incômoda aos ouvinte do disco, que devem abrir uma exceção pois raramente uma relação de amor dessa magnitude entre artista e publico foi registrada num disco.

01. Every Day I Have The Blues
02. Sweet Little Angel
03. It’s My Own Fault
04. How Blue Can You Get
05. Please Love Me
06. You Upset Me Baby
07. Worry, Worry
08. Woke Up This Morning
09. You Done Lost Your Good Thing Now
10 . Help The Poor

BB King & Eric Clapton – Ridding with the King (2000)


Se, como a capa do disco sugere, entraremos numa viagem musical, será uma longa viagem pelas estradas vazias do interior a 130 Km/h, com a capota aberta e o som bombando. Esse disco possui o som relaxante que somente dois veteranos fazendo o que sabem melhor podem transmitir, e o fazem em 12 covers de clássicos do género, algumas do repertório do próprio King, o que dá sentido ao título. Tanto na faixa título mais rock’n roll como na mescla acústica de “Key To The Highway” ou nas doces notas de “When My Heart Beats Like a Hammer”, esse disco emana prazer do principio ao fim.

01. Riding With The King
02. Ten Long Years
03. Key To The Highway
04. Marry You
05. Three O’Clock Blues
06. Help The Poor
07. I Wanna Be
08. Worried Life Blues
09. Days Of Old
10. When My Heart Beats Like A Hammer
11. Hold On I’m Coming
12. Come Rain Or Come Shine

BB King – Singin’ The Blues (1956)


Esse disco é um compilação das lendárias faixas que levaram B.B. King ao sucesso no começo de sua carreira. Originalmente lançado pela Modern Records, pertencente à Crown Records, contém algumas faixas que chegaram às listas de êxitos, entre elas “Bad Luck”, “Every Day I Have The Blues”, “Tem Long Years” ou “Sweet Little Angel”.

01. Please Love Me
02. You Upset Me Baby
03. Everyday I Have The Blues
04. Bad Luck
05.Three O’Clock Blues
06. Blind Love
07. Woke Up This Morning
08. You Know I Love You
09. Sweet Little Angel
10. Ten Long Years
11. Did You Ever Love a Woman
12. Crying Won’t Help You

BB King – Spotlight On Lucille (1991)


B.B. King pode ser considerado o guitarrista elétrico mais influente da história. A flexão das cordas, o vibrato e o fraseado são a matéria prima que guitarristas tão diversos como Jimmy Page ou David Gilmour usaram na construção de seus solos épicos. Esse disco nos traz o esforço de B.B. King em fusionar o country blues, o solo de uma corda aperfeiçoado por Lonnie Johnson e  fraseado jazz dos pioneiros Charlie Christian e Django Reinhardt, num fantástico disco instrumental. Músicas como “Slidin’ and Glidin’” ou “Calypso Jazz” são passagens para o paraíso do blues.

01. Slidin’ and Glidin’
02. Blues With B.B.
03. King of Guitar
04. Jump With B.B.
05. 38th Street Blues
06. Feedin’ the Rock
07. Just Like a Woman
08. Step It Up
09. Calypso Jazz
10. Easy Listening (Blues)
11. Shoutin’ The Blues
12. Powerhouse

BB King – Indianola Mississippi Seeds (1970)


No final dos anos sessenta e começo dos setenta, B.B. King gravaria uma série de discos em Los Angeles utilizando músicos do mundo do rock numa tentativa de sua gravadora de alcançar novamente o sucesso de “The Thrill Is Gone”. Em geral esses disco são fracos, um “enchimento de linguiça” sem emoção, com a exceção desse. Apoiado por grandes músicos como Joe Walsh na guitarra, Carole King e Leon Russel nos teclados e Russ Kunkel na bateria, B.B. King nos presenteia com pequenos clássicos como “King’s Special” ou o blues duro de “Until I’m Dead and Cold”. E temos ainda a única peça gravada de B.B. King ao piano em “Nobody Loves Me But My Mother (And She Could Be Jiving Too)”.

01. Nobody Loves Me But My Mother
02. You’re Still My Woman
03. Ask Me No Questions
04. Until I’m Dead and Cold
05. King’s Special
06. Ain’t Gonna Worry My Life Anymore
07. Chains And Things
08. Go Underground
09. Hummingbird

BB King – Completely Well (1969)


Um dos primeiros discos com inclinações mais populares de B.B. King, que conta com o apoio tanto de músicos de blues como de rock, com notáveis presenças de Al Kooper nos teclados e de Hugh McCracken na guitarra, especialmente no fantástico duelo de “Cryin’ Won’t Help You Now/You’re Mean”. O disco conta ainda com o clássico dos clássicos de B.B. King, “The Thrill is Gone”, que não precisa de comentários. Sua voz visceral e sua característica guitarra definem à perfeição o gosto amargo do amor perdido, e junto com suas letras cruas definem o que é o blues.

01. So Excited
02. No Good
03. You’re Losin’ Me
04. What Happened
05. Confessin’ The Blues
06. Key To My Kingdom
07. Crying Won’t Help You
08. You’re Mean
09. The Thrill Is Gone

BB King – Blues on the Bayou (1998)


Optando pela simplicidade e ajudado por uma excelente banda, B.B. King produz um disco evocando a área rural da Louisiana aonde foi gravado. Após mais de 50 anos no mercado ele sabe perfeitamente o que fazer:  bom blues soar fácil, e cada faixa desse disco é uma prazer aos ouvidos. É o primeiro disco gravado por ele com a banda que o acompanhou em turnês a mais de 14 anos,  gravado em 4 dias ao vivo, sem overdubs ou qualquer melhoria técnica.  Sua música é universal, e esse disco é um encontro relaxado, quase uma jam session entre os fantásticos músicos e King aprontando das suas com a velha Lucille. Em suas próprias palavras, “esse disco é uma volta às raízes, com a certeza de estar tocando com a melhor banda que já tive.” Em fim, é B.B. King em estado puro, com destaque para “I Will Survive” e “Blues Man”, além da espectacular introdução instrumental ao disco, “Blues Boys Tune”

01. Blues Boys Tune
02. Bad Case of Love
03. I’ll Survive
04. Mean Ole’ World
05. Blues Man
06. Broken Promise
07. Darlin’ What Happened
08. Shake It Up And Go
09. Blues We Like
10. Good Man Gone Bad
11. If I Lost You
12. Tell Me Baby
13. I Got Something Outside Help I Don’t Need
14. Blues in G
15. If That Ain’t It I Quit

Grandes Nomes do Blues 32 – B.B. King


Em 1964 o grande músico do Mississippi Riley King deixou os campos de algodão para fazer fortuna em Memphis, levava 2,50 dólares no bolso  e uma guitarra retorcida. Hoje seu nome é sinónimo de blues.

King é certamente o músico que mais influência exerceu nos últimos 50 anos. O vibrato e o sustenido marcaria a toda uma geração de cantores de todos os géneros e os agudos de sua cálida voz sulista brotam das entranhas do blues. E ainda assim, atingir o topo do blues jamais alterou sua humildade e naturalidade.

King nasceu em uma plantação perto de Indianola, Mississippi, no 16 de Setembro de 1925 e não teve uma infância nada fácil. Por um lado, devido às ameaças de Jim Crow e por outro devido à morte de sua mãe aos seus 10 anos de idade. Quando King foi visitar seu primo – intérprete de blues – Bukka White em Memphis, já havia cantado gospel, porém só começaria a ganhar concursos quando liberou sua voz valente e seu carisma, além de um estilo de guitarra muito pessoal, influenciado diretamente por Lonnie Johnson e T-Bone Walker. Em 1948 conquistou um espaço de dez minutos diários na emissora de rádio WDIA vendendo produtos medicinais (como o tónico Pepticon, por exemplo) intercalando suas próprias músicas. King escolhera como nome de guerra “The Beale Street Blues Boy”, mas os responsáveis da emissora o reduziram a B.B. (de Blues Boy). Um ano depois foi lançado pela gravadora local Bullet e pouco depois assinaria contrato com a Modern Records de Los Angeles. Seu primeiro sucesso foi “Three O’Clock Blues” (1951), um aperitivo dos 200 shows que chegaria a dar por ano.

King passou as décadas de 1950 e 1960 em turnê. No começou não chegou a ir muito longe de Memphis, mas com o tempo chegaria até Twist, Arkansas, por exemplo, aonde quase morre por salvar sua Gibson L-30 de um local em chamas, fato pelo qual viria a batizar todas as suas guitarras com o nome de “Lucille”, em homenagem à mulher que supostamente provocou o incêndio.

Começou a percorrer o sul quando já podia ganhar 800 dólares por show, ou seja, depois dos êxitos “You Upset Me Baby” ou “Please Love Me”. No inicio foi acompanhado pelo grupo de Bill Harvey, viajando num Cadillac e outros dois carros, e ocupando os pequenos auditórios dos povoados que a agência Universal Attractions – com sede em New York – ia reservando à medida que avançavam. Por volta de 1955 King já tinha sua própria banda, a B.B. King Orchestra, e havia pedido um empréstimo para comprar seu primeiro trailer, um Aero de segunda mão que batizou de “Big Red”. A partir daí as turnês começaram a incluir as grandes comunidades afroamericanas de Chicago, Los Angeles ou Harlem. Foi exatamente nessa etapa aonde conquistou o maior número de números um, como “Sweet Sixteen”, “Rock Me Baby” ou “How Blue Can You Get” e a influência de um de seus ídolos, Louis Jordan, é facilmente reconhecível. Em 1962 foi contratado pela ABC-Paramount Records e em 1964, o lendário disco “Live at the Regal” – um show em Chicago diante de uma multidão enlouquecida – saiu à venda. Ainda que o público branco estivesse mais centrado no blues acústico, uma nova geração de músicos começou a seguir seus passos: Eric Clapton, Mike Bloomfield, Jimmi Hendrix ou Johnny Winter ajudaram a introduzi-lo aos ouvintes de rock and roll. Em 1970, seu clássico por excelência “The Thrill is Gone”  subiu ao número 15 das listas americanas levando-o ao estrelato.

Desde então King é o maior expoente do blues tradicional, gravando discos excelentes como “Indianola Mississippi Seeds” (1970), “Live in Cook County Jail” (1971) ou “Now Appearing At Ole Miss” (1980). Tendo em Las Vegas seu centro de operações, jamais hesitou em sair dos Estados Unidos e atuar em dezenas de países. Em 1984 entrou para o Hall of Fame do Blues, e em 1987 para o do rock. Nesse mesmo ano ganhou um Grammy por sua trajetória. Em 1989 gravou com U2 “When Love Comes To Town”, apresentando-se assim a uma nova geração de admiradores. Mais de 100 shows de B.B. King foram transmitidos em rádio ou TV a diversos países.

Aos 80 anos, no dia 29 de março de 2006, King tocou na Sheffield’s Hallam Arena no que seria a primeira parte de uma turnê europeia, acompanhado de Gary Moore, e que terminaria dia 4 de Abril com um show na Wembley Arena. Em Julho ele voltou à Europa com a intenção de realizar sua despedida na Suiça, tocando duas vezes no Festival de Jazz de Montreux e também em Zurich no “Blues at Sunset” dia 14 de Julho, mas acabou alargando numa turnê que durou até o 19 de Setembro. Entre Novembro e Dezembro, King tocou seis vezes no Brasil. Durante uma entrevista dia 29 de Novembro em São Paulo, um jornalista lhe perguntou se essa seria realmente sua turnê de despedida, ao qual King respondeu: “Um de meus atores favoritos é um escocês chamado Sean Connery, a maioria de vocês o conhecem como James Bond, ou 007. Ele fez um filme chamado “Nunca diga nunca jamais”.

terça-feira, 12 de julho de 2011

Curtindo a vida adoidado


Com suas frases impagáveis, agressões a mulheres, teorias conspiratórias sobre o 11 de Setembro e seu exibicionismo, Charlie Sheen supera o Império do Entretenimento e redefine o papel da celebridade no panorama cultural
por Bret Easton Ellis


"Drogas” é a primeira palavra que Charlie Sheen profere na sua única cena de Curtindo a Vida Adoidado, uma relíquia cinematográfica de 1986. A cena transcorre numa delegacia de polícia, onde Jeannie Bueller (Jennifer Grey), esperando sua mãe pagar a fiança para tirá-la do xadrez, e reclamando da vida anárquica e encantadora do irmão Ferris (ele viola todas as regras e é feliz; ela segue todas as regras e está infeliz), percebe que está sentada ao lado de um sujeito boa-pinta (bota boa-pinta nisto!), de olhar taciturno e jaqueta de couro, que parece ter passado vários dias numa orgia de drogas.
Mas ele não é um pirado. Está apenas cansado e sedutoramente calmo, seu rosto é de um pálido quase violeta. Aborrecida, Jeannie lhe pergunta: “Por que você está aqui?” Ao que Charlie Sheen, impassível, responde, sem um pingo de arrependimento: “Drogas.” E então, lentamente, ele desarma a irritação de Jeannie com uma calma escancaradamente sexy, transformando o aborrecimento dela em prazer (eles acabam namorando). Aí percebemos Sheen pela primeira vez, nesse momento-chave de sua carreira cinematográfica (que sintetiza tudo o que veio depois).
Ele nunca voltou a ser tão divertido. Até agora. Ao ser demitido da série Two and a Half Men, esse filho mimado do Império do Entretenimento transformou-se no seu mais talentoso achincalhador. Sheen entrou na era pós-Império, e tenta nos explicar o que significa hoje ser uma celebridade. Se você gosta ou não, é irrelevante. É onde estamos, cara. Estamos aprendendo algo. Rock’n’roll. Dance conforme a música.
O pós-Império apareceu com força total no ano passado, quando o “Fuck You” de Lo Green abafou alegremente toda a música em volta. As Kardashian sacaram. Lady Gaga, ao chegar à entrega do Grammy num ovo gigante, sacou; e sacou também no programa de Anderson Cooper, quando disse a eleque gosta de apertar unzinho ao compor – e o desafiou: “Você não pode me impedir, seu mané!” Nicki Minaj saca quandocanta Right Thru Mee vira um de seus vários alter egos num tapete vermelho. (Christina Aguilera como estrela de Burlesque não sacou absolutamente nada.) Ricky Gervais, ao entregar os Globos de Ouro, sacou. Robert Downey Jr., ao se aborrecer com Gervais, não sacou. Ao ridicularizar sutilmente a própria carreira, e o Globo de Ouro que ganhou pelo conjunto da sua obra, Robert De Niro sacou.
James Franco, ao não levar a sério a transmissão do Oscar, e ao tratá-lo com suave desrespeito (que é exatamente o que o programa merece), sacou tudo. (Anne Hathaway, infelizmente, não sacou, mas mesmo assim gostamos dela: por ficar nua e transar com Jake G.) Pós-Império é Mark Zuckerberg falar que A Rede Social e o livro que lhe deu origem (ele cria o Facebook porque é rejeitado por uma guria pentelha!) sacaram tudo errado (e Zuckerberg tem razão, sinto muito Aaron Sorkin, roteirista do Império).
Para cada celebridade do Império que adotava o gênero não-estou-nem-aí, como Muhammad Ali, ou Andy Warhol, ou Norman Mailer, ou Bob Dylan, havia uma dezena de Madonnas (uma das rainhas do Império que nunca foi verdadeira ou engraçada o suficiente para sacar as coisas – tudo o que ela teve de interessante parece, em retrospecto, terrivelmente honesto) e Michael Jacksons (a suprema vítima da cultura da celebridade do Império – um amante torturado de meninos e viciado em drogas que, não tendo nenhum senso de humor, negava as duas coisas).
Para alguém da minha idade (47 anos),o Keith Richards (67) do seu livro de memórias, Vida, exibe uma transparência excêntrica e saudável, típica do pós-Império. Para meus amigos mais jovens, essa atitude não é mais uma raridade; virou a norma. Mas nada se compara, ainda, à transparência exibida por Charlie Sheen nas últimas semanas – desdém pela celebridade, por sua profissão e pela velha ordem mundial do Império do Entretenimento.
Para os vigilantes do Império, Sheen é perigoso e parece precisar de ajuda porque está destruindo (e confirmando) ilusões sobre a natureza da celebridade. Ele sempre foi um modelo para certo tipo de fantasia masculina. Degradante, talvez, mas não é assim boa parte das fantasias masculinas? Sheen sempre foi encrenqueiro, algo que faz parte do seu carisma – junto a homens e mulheres. O que Sheen fez foi virar um exemplo e iluminar o momento atual da cultura: aquele no qual não se importar com o que o público pensa de você ou da sua vida pessoal é o que importa – e isso faz o público adorar você ainda mais (embora a CBS ou o criador do programa que o enriqueceu não compartilhem a adoração).
Trata-se de um narcisismo diferente do habitual no Império do Entretenimento. Quando surgiu, Eminem foi o personagem pós-Império mais sincero. Subitamente, ele nos colocou a anos-luz de distância da dor autobiográfica de, digamos, Blood on the Tracks, de Bob Dylan (um dos momentos mais altivos e elegantes do Império). Hoje, a autoexpressão é diferente – mais bruta, menos diluída. Em The Marshall Mathers LP, Eminem mostra com muito mais transparência do que Dylan, ou qualquer outro artista do Império (incluindo aí o Bruce Springsteen do grande Tunnel of Love), sua raiva contra a idioticedos seus próprios erros, o fracasso do seu casamento, seus vícios e fantasias, registrando sem medo o falso assassinato de sua ex-esposa por suas próprias mãos enraivecidas, um ato de desafio que Bob ou Bruce Springsteennem sequer cogitariam. Blood on the Tracks Tunnel of Love possuem um bom gosto e elegância imperiais que não fazem mais sentido no pós-Império. Isso não nega o poder e o talento artístico dos dois. Significa apenas que estamos em movimento. É isso aí.
Você está completamente por fora se acha que o piro de Charlie Sheen é um problema de drogas. Claro, elas desempenham um papel, mas não estão no centro dos acontecimentos – nem explicam por que o piro de Sheen é tão fascinante. Conheço viciados funcionais. Eles não são nem tão raros nem tão interessantes assim. O piro diz respeito só a Charlie Sheen. Diz respeito a uma merecida crise de meia-idade alardeada na CNN, e não no escritório de um assessor de imagem de Hollywood.
A crise dos 40 é o momento na vida de um homem em que ele se dá conta de que não consegue (ou não quer) manter a atitude que esperam dele. Tom Cruise sofreu um colapso semelhante no verão de 2005, mas o enfrentou de forma mais polida (e, claro, não consta que ele fosse viciado em drogas). Cruise teve seu colapso enquanto sorria. Ele sempre foi, basicamente, o bom rapaz incapaz de dizer “foda-se” como Sheen diz. Cruise ainda é o coroinha suburbano que acredita no glamour do Império – o que é também, em última análise, a sua limitação como ator e astro de cinema.
Com Charlie Sheen, uau, é outra coisa. Prisões. Overdoses. Temporadas meio que involuntárias em clínicas de reabilitação. A entrevista coletiva de Martin Sheen com os olhos rasos d’água. A maleta cheia de cocaína. O Mercedes rebocado do despenhadeiro. A agressão à terceira esposa, que também foi parar numa clínica de reabilitação. Sheen supostamente ameaçando decapitá-la, botar a cabeça numa caixa e enviá-la à mãe dela. Sheen acendendo um cigarro no outro no site do TMZ. As frases impagáveis. (Sobre os executivos da CBS: “Eles se deitam com suas mulheres feias diante de seus filhos feios e contemplam suas vidas fracassadas.”) As teorias conspiratórias sobre os atentados de 11 de Setembro. Atirar no braço de Kelly Preston. Transar com estrelas pornô. Comparado a Cruise, Sheen fez uma exibição sincera, fascinante e revigorante da crise da meia-idade. Ele é simplesmente, assim mesmo, um viciado – é pegar ou largar.
É eletrizante ver alguém se insurgir contra a pompa das entrevistas de celebridades, e Sheen desafia com estridência tal impostura. Ele é rude, lúcido e intenso: uma pessoa fascinante surfando o panorama cultural. (Não, pessoal, ele não é Colin Firth, nem David Fincher, nem Bruno Mars, nem Tiger Woods, esse epítome do Império.) Não estamos acostumados a esse tipo de entrevista. É quase uma performance artística, nunca vimos nada igual – porque ele não pede desculpas. É um espetáculo irresistível. Jamais vimos uma celebridade se abrir assim. Mesmo nas evasivas, há em Sheen uma verdade bem-humorada que faz a entrevista coletiva-confissão de Tiger Woods parecer falsa e manipulativa.
Qualquer um que tenha se sujeitado à condição de celebridade (ou teve problemas com drogas) tem agora uma alma gêmea. Eis a novidade: se você soca os paparazzi, é um perdedor fora de moda. Se não consegue aceitar que estamos no auge de uma cultura exibicionista, e que será pego de surpresa pelo TMZ ao sair cambaleante de uma boate às duas da matina, então você deveria ser um agente de viagens em vez de um astro do cinema.
Ser ridicularizado publicamente é parte do jogo, e você é um bobo se não joga. Não ir à cerimônia para receber o troféu de pior filme do ano? Mas isso é tão típico do Império! Por isso Charlie Sheen parece hoje mais saudável e engraçado do que qualquer outra celebridade. E também faz piadas mais engraçadas sobre si mesmo do que os colunistas sisudos e os comediantes de fim de noite.
Grande parte disso tudo é fanfarronice de moleque encrenqueiro – xingar para ver como as pessoas reagem, o que é bem pós-Império –, mas grande parte é transparência, e, nesse nível, Sheen está... vencendo.
O que as pessoas querem de Charlie Sheen? Não nego que ele tenha problemas com drogas e álcool – ou mesmo que possa estar enfrentando um distúrbio mental. Mas isso acontece com um monte de gente em Hollywood, que sabe se esconder melhor – ou com quem a imprensa de celebridades não se importa tanto. O que nos fascina é o seu hedonismo, que faz qualquer homem babar de inveja – se não houvesse sempre mulheres por perto para desmascarar as bravatas. (Sua suposta propensão à violência contra as mulheres tampouco prejudicou sua popularidade entre as fãs.)
Queremos realmente boas maneiras? Civilidade? A cortesia do Império do Entretenimento? Para o inferno com tudo isso. Queremos realidade, por mais doida que seja. E é isso que deixa o Império fora do prumo: Sheen não liga para o que pensam dele, e caçoa do conceito de relações públicas. “Ei, engravatados, estou cagando e andando.” Esse é seu único mandamento. Sheen explode o mito de que, se os homens se esforçarem, irão superar a busca adolescente do prazer e de uma vida sem regras ou responsabilidades.
Andamos bastante nas últimas semanas: Sheen é a nova realidade, cara, e quem estiver contra que se junte ao resto dos trolls no cemitério do Império. Ninguém sabia em 1986, mas desde o princípio Charlie Sheen era, na verdade, o cara que queria curtir a vida adoidado.

Depois de muito tempo resolvi voltar...

Queridos leitores, como eu já havia anunciado anteriormente, a constância não é uma das minhas maiores virtudes. Porém, depois de um longo tempo ausente por motivos alheios às minhas vontades, aqui estou eu de volta. Abaixo vocês podem conferir ao novo número dos GNB, e nos próximos dias mais coisas interessantes darão as caras por aqui. Bom, sem perder o tempo com esse papinho fraco, os deixo.

PS: Todos os links para download do blog estão reativados, caso você ainda não tenha baixado o que gostaria.

Albert King & Stevie Ray Vaughan – In Session (1983)


No dia 6 de Dezembro de 1983, o já lendário Albert King uniu-se ao seu discípulo Stevie Ray Vaughan num estúdio  de TV no Canadá para a série ao vivo intitulada “In Session”, e o resultado foi mágico, forçando seu lançamento também em disco. Como disse o musicólogo Samuel Charters “Era evidente desde os primeiros acordes que eles estavam tocando um para o outro, e esse era o melhor público que um dia poderiam ter. A música nunca perde intensidade, tem a qualidade de algo muito importante sendo levando adiante e tempo tanto para Stevie como para Albert verem até aonde eram levadas suas ideias.” É um documento sobre uma das melhores noites na música de Stevie Ray Vaughan, disco obrigatório para qualquer fã de blues. Para os ainda mais apaixonados foi lançado em DVD o documento em vídeo desse encontro, com algumas faixas extras incluídas.


01. Call It Stormy Monday
02. Old Times
03. Pride and Joy
04. Ask Me No Questions
05. Pep Talk
06. Blues at Sunrise
07. Turn It Over
08. Overall Junction
09. Match Box Blues
10. Who Is Stevie
11. Don’t Lie to Me

Albert King – I’ll Play the Blues for You (1972)


Esse pode ser considerado o disco definitivo de blues-soul. Segue uma formula um pouco diferente de “Born Under a Bad Sign”, agregando à música de King os membros da lendária Bar-Kays, Isaac Hayes, e os Memphis Horns. O resultado é um blues impregnado de funk que abria espaço para a guitarra de King. Nesse disco já se pode apreciar músicas mais longas, sem as amarras formais do disco anterior. “I’ll Play The Blues for You” e “Breaking Up Somebody’s Home” passam dos sete minutos, enquanto “I’ll Be Doggone” e “Don’t Burn Down the Bridge” (aonde King adota um estilo James Brown “Take it to the bridge”) superam os cinco minutos. As linhas de baixo de James Alexander libera King para ir desde um blues mais duro aos típicos choros apaixonados de sua guitarra, num dos melhores discos de sua época na Stax.


01. I’ll Play The Blues for You
02. Little Brother
03. Breaking Up Somebody’s Home
04. High Cost of Loving
05. I’ll Be Doggone
06. Answer To The Laundromat Blues
07. Don’t Burn Down The Bridge
08. Angel of Mercy

Albert King – Born Under a Bad Sign (1967)

“Born Under a Bad Sign” é de uma época aonde os discos eram nada além de uma colectânea de singles, e de quando os singles, por imposição das rádios e das jukebox, não podiam passar dos três minutos e meio. Essa limitação forçava aos artistas a necessidade de um impacto rápido e firme. No blues, a tendência de estender-se no fraseado tinha que ser contida, e nesse disco podemos apreciar alguns bons exemplos de como King o fazia, com sua voz e guitarra dando credibilidade ao single comercial e convertendo-os em clássicos. Essas 11 faixas mostram o período mais fértil de King, nos anos de 66 a 68 tocando para a Stax Records. Jim Stewart, chefe da gravadora na época, era relutante em contratar músicos de blues por achar que o blues duro não combinava com o típico soul de Memphis que haviam patenteado. Ironicamente, a fusão dos lamentos agudos da guitarra de King com os ritmos dinâmicos de Booker T. & the MGs – banda base da Stax – é o que separou King dos outros bluesman da época. Essa mistura única produziu um clássico atrás de outro: O piano de Booker T. Jones impulsa “Laundromat Blues”. As variações da bateria de Al Jackson dão base a “Crosscut Saw”. Os metais de Andrew Love, Wayne Jackson e Joe Arnold conduzem o tom de “Born Under a Bad Sign”. E a voz doce e madura de King encaixa à perfeição a essa base de soul enquanto dispara seus dramáticos acordes na guitarra.


01. Born Under a Bad Sign
02. Crosscut Saw
03. Kansas City
04. Oh, Pretty Woman
05. Down Don’t Bother Me
06.  The Hunter
07.  I Almost Lost My Mind
08. Personal Manager
09. Laundromat Blues
10. As The Years Go Passing By
11. The Very Thought of You

Grandes Nomes do Blues 31 – Albert King



Os discos que Albert King gravou para a Stax nos anos sessenta e setenta são até hoje marcos do blues moderno. Canções como “Born under a bad sign” ou “I’ll play the blues for you” são receitas para muitos guitarristas contemporâneos em busca de uma pauta. Mesmo pesando 110kg e com quase dois metros de altura, tinha uma voz melosa, um tom de guitarra suave e exprimia experiencias de uma vida inteira em cada nota que tocava.

Albert Nelson nasceu dia 25 de Abril de 1923 em Indianola, Mississippi (perto de onde pouco depois viria a nascer B.B.King, aguardem pelo próximo post). Enquanto crescia numa fazenda do Arkansas, Albert pôde disfrutar da música de Howlin’ Wolf – que passou uma temporada pela região – a quem passou a imitar pouco depois, tocando pela zona em 1939. Anos mais tarde, King chegaria até South Bend, Indiana, cantando com o quarteto de gospel Harmony Kings, antes de transladar-se a Chicago e tocar a bateria para Jimmy Reed, Jackie Wilson, Brook Benton, entre outros.

Enquanto isso continuava praticando e evoluindo sua técnica na guitarra. Passou do violão à guitarra eléctrica tomando como base o estilo de B.B.King – de quem tomou emprestado também o pseudónimo. Essas proximidades com B.B.King são facilmente reconhecidas nos primeiros trabalhos de Albert para os selos Parrot e Bobbin, como “Don’t Throw Your Love On Me So Strong” (1961). Quando em 1966 assinou contrato com a Stax Records, seu estilo já estaria completamente definido. Ao final dos anos cinquenta comprou uma Gibson Flying V, guitarra que seria sua marca e com a qual subiria o volume do amplificador, passaria a tocar em Mi Menor e faria que sua canhota desse forma ao seu som definitivo –  espremendo o matiz das cordas e retorcendo as notas – espelho anímico de sua melosa voz gospel.

"Se você escutar aos guitarristas de blues atuais, perceberá que quase o noventa por cento do que tocam é Albert King" - Carl Weathersby 

Os discos de King para a Stax contaram com a colaboração mais que especial de artistas do calibre de Booker T. and the MGs, Isaac Hayes ou os Memphis Horns, e representavam o passo que faltava do blues ao soul. King entrou finalmente no mercado branco graças à chegada da FM, com a colaboração de Eric Clapton e da versão do Cream para “Born Under a Bad Sign”, e sua reputação dentro do mundo do rock se assentou definitivamente em 1964 ao abrir uma série de shows no Fillmore Auditorium de San Francisco para Janis Joplin e Jimi Hendrix.

A fama de King se manteve durante os anos setenta, ainda que o blues não passasse por um bom momento devido ao domínio do rock nas emissoras de rádio e à chegada da música disco nas pistas de dança, aonde antes reinava a música ao vivo. Felizmente King conseguiu seguir com seu trabalho ajudado por um jovem guitarrista chamado Stevie Ray Vaughan e de onde tocava, o Armadillo World Headquarters de Austin, Texas. Mesmo depois de atingir o ápice do blues e do rock, Vaughan não só fazia inúmeras versões de músicas de King, como insistia em convidar-lhe aos seus próprios shows. Em 1983 tocaram juntos para a rede de televisão CHCH de Hamilton, Ontario, e dessa sessão e eventual entrevista surgiu o disco postado mais adiante aqui.

Ainda que King jamais tenha alcançado a fama que conquistou nos anos sessenta com a Stax, não parou de tocar até que um ataque do coração acabou com sua vida em Memphis, dia 21 de Dezembro de 1992. Seu corpo descansa no cemitério Paradise Gardens de Edmonson, Arkansas, e em sua lápide pode-se ler “I’ll Play The Blues For You”.

segunda-feira, 11 de julho de 2011

Muddy Waters – King Bee (1981)


Último dos tres discos de Muddy Waters produzidos por Johnny Winter entre o final dos 70 e começo dos 80 – os outros dois são “Hard Again” de 1977 e “I’m Ready” de 1978. Com 66 anos e acompanhado por uma banda magnífica, com Johnny Winter, Bob Margolin e Luther “Guitar Jr.” Johnson nas guitarras, Calvin Jones no baixo, Willie “Big Eyes” Smith na bateria, “Pine Top” Perkins no piano e Jerry Portnoy na gaita, Waters nos presenteia com pérolas como o blues lento “Sad Sad Day”, a funkeada “(My Eyes) Keep Me In Trouble” e a acústica “I Feel Like Going Home”, com Johnny Winter tocando uma impressionante slide guitar inspirada em Son House.

01. I’m A King Bee
02. Too Young To Know
03. Mean Old Frisco Blues
04. Forever Lonely
05. I Feel Like Going Home
06. Champagne & Reefer
07. Sad Sad Day
08. (My Eyes) Keep Me In Trouble
09. Deep Down In Florida #2
10. No Escape From The Blues

Baixe aqui e escute:

http://www.zshare.net/download/92535071ec8ba479/